Como aliviar a raiva e o ressentimento
Já alguma vez tiveste a oportunidade de realmente observar a raiva quando ela começa a surgir?
Um dia pode acontecer de estares com atenção e te aperceberes daquele calor, daquela coisa imensa que vem lá do fundo a subir… com toda a força e pronta para explodir… e ficas completamente estarrecido a pensar como é possível que estejas a sentir uma coisa assim…
Pois, pode acontecer. Isso é raiva contida que, por alguma razão, se soltou nesse momento e tu apercebeste-te a tempo de olhar para ela, e quando te apercebes e encaras, ela transforma-se em nada!
É que é mesmo assim, simples e fácil. Se a encarares no momento em que ela vem decidida a lixar-te a vida, ela simplesmente perde a força e acaba por se esfumar.
E não só, muito dificilmente ela voltará com essa força. É natural que venhas a ter mais uns acessos de irritação, mas nada que não consigas controlar.
O porquê da raiva
Existem muitas razões para o surgimento de um acesso de ira; ela pode surgir devido ao desejo de que as coisas, situações ou pessoas ao teu redor fossem diferentes, ou melhores, ou como tu consideras que deveriam ser… Tu achas que as outras pessoas se deveriam comportar como tu te comportas, ou pensar como tu pensas, ou acreditar no que tu acreditas. E como isso não acontece… irritas-te, e a culpa é deles.
Consideras que são os outros que te enervam porque fazem ou dizem coisas que não deveriam fazer ou dizer (de acordo com os teus padrões, claro).
Como nós passamos a maior parte dos nossos dias distraídos com milhões de pensamentos e tarefas para realizar, nem nos apercebemos do que se passa no nosso interior e por vezes, do nada, surgem aqueles acessos de ira tão rápidos e automáticos que nem te apercebes da sua chegada. E nem sabes porquê. Simplesmente te irritas! É daquelas coisas que não se controla.
Por outro lado, se és daquelas pessoas que se contém e vai acumulando, corres o risco de um dia por uma coisa mínima, acabares por explodir.
Numa explosão dessas podes ter atitudes ou dizer palavras que vão ficar marcadas nos dias da tua vida, e tu até te podes esquecer delas, mas garanto-te que quem te viu ou te ouviu, nunca se irá esquecer!
Existem pessoas que conseguem aguentar e calar, não existem explosões nem manifestações. São pessoas que conseguem manter tudo muito bem controlado sem deixar transparecer nada cá para fora. Mas a raiva está lá e possivelmente irá transformar-se em doença e manifestar-se de outra forma. Já diziam os antigos que “a raiva corrói o corpo” e é verdade, problemas ósseos e articulares são certos, para não falar de umas úlceras gástricas, o que também é muito bom.
A Raiva e a energia do Fígado
Na Medicina Tradicional Chinesa a raiva é a emoção ligada à energia do fígado. O Fígado controla o fluxo de Qi pelos meridianos e corpo, armazena o sangue e controla o funcionamento dos tendões. A saúde dos olhos e das unhas também estão ligados à energia do fígado.
Para além de regular a circulação de energia (Qi), o fígado também controla a circulação de outras matérias, participando assim no equilíbrio de várias funções do corpo e da mente, nomeadamente na estabilidade emocional, na digestão e na harmonização menstrual.
O fígado pertence ao elemento madeira que nutre o elemento fogo. O Fogo corresponde ao coração, raiva excessiva consome o fígado e o coração não é nutrido suficientemente. Por aqui dá para entender como um dia de irritação leva ao cansaço e à fadiga. Se este estado emocional se mantém repetidamente ao longo do tempo, todos os órgãos serão afetados e todo o organismo vai sofrer. O sistema imunitário enfraquece e podem surgir todo o tipo de más situações ou condições de doença.
Mas…
Não devemos esquecer que a raiva é uma emoção humana, faz parte de nós e é necessária.
A raiva é um mecanismo de intervenção que existe em nós para nos levar a tomar uma ação imediata, por vezes de defesa. Ela existe, devemos aceitá-la e podemos até servir-nos dela para nos ajudar a superar situações difíceis como o desânimo, a desilusão, a depressão, etc.. Mas convém expressá-la de maneira saudável.
Para tratar e gerir a raiva excessiva temos que atuar em várias frentes:
- Perceber quais as situações que levam ao seu surgimento
- Olhar com atenção para o que se está a passar, é necessário ter alguma consciência dos nossos pensamentos no momento
- Respirar fundo
- Tentar perceber se a situação é realmente como a vemos ou se existe a possibilidade de estarmos errados – a melhor forma de fazer isso é perguntar em vez de tirar conclusões precipitadas
- Afastarmo-nos da situação até conseguirmos acalmar
- Trabalhar a auto-estima e o amor próprio.
Encarar e resolver
Nem sempre é fácil perceber as situações que fazem disparar a raiva quando ela surge, e se a pessoa se deixar dominar por ela será ainda mais difícil, é preciso recuar, respirar e ter coragem para encarar.
Encarar significa olhar para dentro de nós com honestidade e ver se estamos zangados porque os outros não correspondem às nossas expectativas.
Encarar também pode significar fazer perguntas e indagar se a situação é realmente como pensamos ou se, simplesmente, criámos um filme na nossa cabeça que não tem nada a ver com a realidade da situação.
Por exemplo:
Tu vês no extrato bancário que o teu marido gastou dinheiro numa loja de lingerie e não te deu nada, e ficas a pensar, e passam os dias e nada, e cada vez estás pior, estás a ficar com uns nervos… até que lhe perguntas e ele muda de assunto. E tentas outra vez e quando vês que ele continua a fugir à questão, explodes! E acusas, e dizes coisas menos bonitas. Ele ouve tudo o que tens para dizer e no fim vai buscar a tua prenda que tinha guardada para uma surpresa que te ia fazer no Sábado. Ele ama-te muito e vai perceber que até estavas um pouco insegura e que ás vezes tens umas parvoíces, e perdoa-te… mas não se vai esquecer, e acabaram-se as surpresas!
Respirar fundo é uma solução rápida e eficaz, respirar profunda e calmamente. Encher bem os pulmões de ar e deitar tudo para fora umas duas ou três vezes pode fazer milagres.
Caminhar na natureza ou ir ter com um amigo para dispersar as energias maléficas também podem ser boas soluções, mas o trabalho mais profundo também tem que ser feito para evitar que as situações continuem a surgir.
A prática do Qi Gong e da meditação ensinam a viver em consciência, a perceber o que se passa connosco momento a momento e podem ajudar a descobrir quais são os teus gatilhos.
São duas ferramentas muito úteis para aprender a gerir as emoções e os sentimentos, além de que te relaxam, melhoram a tua autoestima e autocontrole.
Portanto:
Quando percebes que te estás a começar a passar, respira fundo. Inspira profundamente e deita o ar todo para fora. Faz isto algumas vezes.
Se não resultar, afasta-te da pessoa ou situação. Vai dar uma volta, vai apanhar ar e respirar fundo até sentires mais calma.
E não permitas que a irritação vá crescendo e acumulando à medida que o teu dia vai decorrendo. Vai respirando e aliviando.
Exercício meditativo para a raiva
Se quiseres trabalhar um pouco mais a fundo esses acessos de ira, faz esta meditação.
A prática deste exercício de meditação vai oferecer-te uma maneira de lidar com a raiva quando estiveres bem no meio dela.
Mas, antes de começares a fazer isto em casos de raiva extrema, convém praticar com um assunto ou situação que te irrite um pouco mas que não seja muito forte.
Senta-te de forma confortável num local sossegado e pensa em algo te irrita ou te tira do sério para fazeres o exercício
Sempre que faças isto e se quiseres trabalhar ainda mais a fundo, ao terminar o exercício faz uma pausa para escreveres num caderno ou diário.
Escreve o que notaste no corpo, o que descobriste por trás da raiva e qual foi a sensação de lhe responderes com amor e compaixão.
À medida que fizeres isto quando sentires raiva, vais ver que vais sendo capaz de lhe responder com sabedoria e paciência. E quanto mais praticares mais fácil será manter a calma em situações adversas.
E leva isto como uma tomada de ação e decisão saudáveis para teu benefício e dos outros ao teu redor, nomeadamente família, colegas de trabalho e também amigos.
O Qi Gong
Uma boa prática de Qi Gong para gerir as emoções é o Ba Duan Jin – são 8 exercícios que te trabalham bastante o corpo e a tua força interna. Todos os exercícios te vão ajudar, mas se a intenção é deitar tudo para fora, faz as expirações mais profundas que as inspirações. E entrega-te aos movimentos de corpo e alma, faz a forma marcial e vais ter muito bons resultados. A raiva é uma emoção poderosa, essa energia pode ser canalizada para muitas outras coisas.